Por: Márcia Rocha - Cervejaria Rio Preto
“Por que seria diferente quando se trata de cerveja? Homens e mulheres podem apreciar uma variedade de produtos. Compartilhamos os mesmos vinhos, saboreamos as mesmas refeições. Então, por que a cerveja seria uma exceção? “ Com essa provocação de Paula Yunes, adentramos um debate sobre a presença feminina no universo cervejeiro. Não se trata de excesso de feminismo ou de argumentos 'vitimistas', mas sim da realidade e da vagarosa evolução do setor cervejeiro para incluir as mulheres.
Embora a produção de cerveja tenha sido iniciada por mulheres há 11.000 anos e o estudo das propriedades do lúpulo, um dos principais ingredientes, tenha sido conduzido pela monja e teóloga alemã Hildegard von Bingen no século XII, as mulheres perderam seu protagonismo à medida que a produção aumentava visando a comercialização. Além das propagandas machistas do passado que ressaltam a necessidade de desconstruir e questionar a presença feminina neste setor.
Já por volta dos anos 2000, a cerveja era um produto pouco valorizado que necessitava de uma mudança de status. Segundo Cilene Saorin, uma das pioneiras no mercado cervejeiro brasileiro, as empresas começaram a mudar sua postura. Em vez de simplesmente usar a imagem feminina em propagandas, as cervejarias começaram a procurar mulheres como profissionais e também como consumidoras de seus produtos.
De acordo com uma pesquisa recente da Kantar citada pela revista Exame (2022), as mulheres das classes A e B, entre 40 e 49 anos, foram as principais responsáveis pelo aumento de 27% no número de consumidores de cerveja no terceiro trimestre de 2021 no Brasil, em comparação com o mesmo período de 2019. Além de movimentar financeiramente esse setor como consumidoras, as mulheres também estão assumindo cargos que, anteriormente, eram predominantemente ocupados por homens.
Mas infelizmente, a realidade vivenciada pelas mulheres que trabalham com cerveja nem sempre reflete os dados das pesquisas. Com oito anos de experiência no setor cervejeiro, vivenciei situações de preconceito, como comentários desrespeitosos durante entregas de chopp por delivery ou em eventos. Frases como 'P**** mandaram uma menina para resolver esse problema?' ou 'Se eu não resolvi, essa garota vai resolver?!' ainda são ouvidas...
O preconceito não se limita apenas aos consumidores, mas também está presente no próprio mercado cervejeiro. Em eventos ou feiras relacionadas a Cervejas Artesanais, se estiver acompanhada de um homem, é comum que o vendedor ou expositor dirija-se primeiro a ele para falar sobre o produto, pois mulheres não correspondem ao estereótipo padronizado.
Contudo, acredito que a relação entre homens e mulheres vem melhorando no trabalho conjunto no mercado cervejeiro. É nossa responsabilidade conscientizar os consumidores sobre o respeito às mulheres e enfatizar que não há um estereótipo para ser um bom profissional neste setor.
Concluo a reflexão desse texto com as palavras de Paula Yunes: “Mulheres, não liguem para comentários depreciativos. Pense que o problema está na cabeça de quem tem preconceito e não em você. Faça tudo que tiver vontade! ”
Márcia Rocha
Engenheira de Alimentos
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